terça-feira, junho 30, 2009

4 - Nova perspectiva


A minha vida mudou tanto, mano... Parece que nestas últimas semanas tudo ganhou um novo significado, acho que voltei a sentir... Ainda não sei muito bem o que sinto, mas é como se tudo tivesse voltado a fazer sentido outra vez.

Lembras-te de ter falado de um quase acidente que tive por causa de um tipo com quem me cruzei na rua, muito parecido contigo? Há umas semanas atrás a banda dele foi tocar ao bar onde trabalho aos fins-de-semana. O concerto já tinha começado há um tempo considerável e eu andava tão absorta entre copos e garrafas que nem tinha olhado para a banda. Entretanto uns versos de uma música prenderam a minha atenção: "Não há histórias de amor para sempre, porque perdeste o teu príncipe e já só te resta o amor que sentes, solitário e desesperado". Olhei e vi-o... O mesmo tipo, o mesmo género de roupa, os olhos pintados... Voltei a ver-te. "Nada acontece por acaso", foi a primeira coisa que pensei enquanto sentia um arrepio frio a percorrer-me a espinha.

No fim do concerto sentou-se ao balcão e pediu um gin tónico. Ficámos uns instantes perdidos no olhar um do outro e quando dei por mim estávamos a conversar sobre a banda que ia actuar no dia seguinte e não nos calámos mais. Desde esse dia, temos saído juntos, ele passa por aqui de vez em quando. Falamos de tudo e de nada, falamos do tempo, do jogo de futebol do dia anterior, da cicatriz que tenho no dedo mindinho desde os oito anos, do final do filme que acabámos de ver... Não interessa! A verdade é que ficamos horas à conversa sem dar pelo tempo passar. Hoje vamos beber um copo às docas. Ele perguntou-me se podia ir sem saltos, diz que é melhor abraçar-me quando ando descalça lá por casa. Perguntei-lhe se era assim tão ameaçador eu ser ligeiramente mais alta que ele quando uso saltos. - Gosto mais de abraçar-te e sentir-te pequenina ao meu lado. Eu sorri e disse-lhe que ia fazer o sacrifício.

Não sei o que sinto por ele, mano... Não sei se gosto dele, mas voltei a sentir qualquer coisa. Sabe bem rir-me com ele por tudo e por nada, sim, porque afinal tem um humor contagiante, que em nada se coaduna com o seu ar de niilista! Sabe bem voltar a sentir ansiedade quando faltam 15 minutos para ele me vir buscar... Sabe bem sentir-me a corar quando ele me apanha a olhar descaradamente para ele... Sabe bem estar com ele. Não sei se gosto dele, ou do que ele me faz sentir.... mas gosto dos momentos que passamos juntos. Dou por mim a rir-me sozinha das piadas dele. Ele faz-me bem... Acho que voltei a ser eu.

Não sei se gosto dele... Não sei se é só meu amigo... Não sei se me sinto atraída por ele (se calhar era mais fácil chegar a alguma conclusão acerca deste assunto se ele não fosse tão parecido contigo!) E sim, no início tinha a sensação que te voltava a ter comigo quando estava com ele. Mas, apesar das óbvias semelhanças físicas, vocês são muito diferentes. Hoje sinto que gosto de estar com J. pelo que ele é, pelo que sou quando estou com ele... Mostrei-lhe uma foto tua e ele disse que de facto podia ser uma foto dele há uns anos atrás. - Mas eu sou muito mais bonito! - assegurou, enquanto me devolvia a fotografia e olhava para mim com um ar de quem estava em pânico, porque tinha a certeza que eu ia chorar. Não chorei.

Falamos muitas vezes de ti, também já falámos do Pedro, do acidente, falámos até do meu medo do espelho e nunca chorei. Consigo falar com ele sobre tudo, sobre assuntos que guardei sempre para ti e para o Pedro, e ele percebe sempre, diz sempre aquilo que eu quero ouvir.

Nunca aconteceu nada, nunca nos beijámos. Já houve alturas em que trocámos olhares tão cúmplices que quase aconteceu, quando ele me abraça, mas nunca nenhum de nós deu o primeiro passo. E também nunca falámos do quase acidente. Tenho a certeza que ambos sabemos que ficámos a olhar um para o outro daquela forma, mas nunca falámos sobe o assunto. Pergunto-me porque razão terá ele olhado para mim daquela maneira... Eu tenho uma desculpa, vocês são parecidíssimos, mas e ele? Qual será a desculpa dele? Eu não faço nada o género dele, acredita!

Quando estamos juntos é como se fossemos um mistério um para o outro. Ele está sempre a surpreender-me. Quando está comigo é tão diferente do J. que está em palco... Vai-se o olhar triste e melancólico e fica um sorriso lindo e contagiante. E ele diz o mesmo de mim... Quando entrou no meu quarto perguntou-me se a minha vasta bibliografia sobre vampiros e a discografia de Lacuna Coil e Muse eram mesmo minhas. Diz que saltos altos e roupas de "menina bem" não combinam muito com o que eu tenho cá dentro.

Não sei onde é que isto vai parar... mas estou muito bem assim. Acho que estamos os dois. Só há um pequeno "mas", no meio desta história toda... Ele tem namorada... Falou-me dela logo quando nos conhecemos. Uma tal de Rute. Está cá a estudar e vai embora aos fins-de-semana. Por isso passamos tanto tempo juntos. Mas mesmo durante a semana ele vem ter comigo. Não pergunto como faz para poder estar comigo com a namorada cá. E ele não voltou a falar dela. Finge que ela não existe, aliás, acho que fingimos os dois...
S. M.

quarta-feira, junho 24, 2009

Afinal não é bem como eu pensava...

- Dá pra trocar?
- Não. Foi a senhora que escolheu...
- Então queria apresentar uma reclamação. Isto não é bem o que me pareceu inicialmente...


Há pessoas que acabamos de conhecer e nos dizem muito. Parece um cliché, é certo, mas temos a sensação que as conhecemos de algum lado, há já muito tempo, só não sabemos de onde.

Outras há que nos fazem experimentar as mais variadas sensações - medo, curiosidade, inveja, pena, repugnância, admiração ou antipatia.

Ainda não me decidi o que sinto por ti, depois de tantos meses, mas talvez seja pena...

Olho-te, sempre tão seguro de ti, sentado nas escadas de cigarro entre os lábios. Ouço-te dizer mais uma das tuas graçolas patéticas que mais não são do que piadas que encontras na Internet, onde passas grande parte desses teus dias amorfos e sem sentido. A verdade é que as piadas até têm graça, mas a maior parte das vezes não consigo sequer forçar-me a esboçar um sorriso, porque não consigo encontrar qualquer graça a esta tua tacanhez...

O que te define são piadas e frases que já alguém disse. Respondes às perguntas que te fazem, quando te vêem cabisbaixo, com sentimentos que não te pertencem, com frases pomposas que dizem tudo e não dizem nada, frases de alguém que pelagias para dar à tua vida um tom tão colorido e alheio. De tantas vezes que as lês, de tantas vezes que as dizes, passam a ser tuas.

Defines-te como um homem com grande capacidade de superar as rasteiras que a vida teima em te pregar, como alguém muito seguro de si e inteligente. Mas quem te conhece dificilmente te vê como tu te vendes.

Falas e a tua vida soa-me a uma mentira que tu já assumiste como verdade. Só precisas de mentiras, sorrisos, piadas e frases feitas e vendes uma imagem de ti que engana qualquer um à primeira vista. És como uma réplica mal acabada de outras vidas e outro mundo, um mundo que não é o teu.


Não, obrigada, não quero comprar.

quarta-feira, junho 03, 2009

Quase, quase perfeito...




Olhou para dentro de si mesma e viu raiva, angústia e medo. Viu sangue e escuridão. Viu rancor e lágrimas. Lágrimas que chorara num passado longínquo, tão longínquo que mal o recordava, apesar de ainda sentir o sabor das lágrimas na sua alma, ainda sentir a dor que lhe dilacerava o ser, perdido e decrépito entre gastas mortalhas. Quis sair de si e falar-lhe, quis gritar-lhe que não se fosse... Quis tocar-lhe e senti-lo dentro de si. Quis olhá-lo nos olhos e sorrir-lhe, mas ele já lhe tinha virado costas, já tinha abandonado à pressa todos os recantos secretos que só a eles pertenciam.
Recordou-o e lembrou-o cobarde demais para ficar ao seu lado, lembrou-o perfeito demais para simplesmente se deixar levar pelo que sentiam. Não lhe chegava o que ela lhe dava. Não lhe chegava o que ela nunca lhe exigiu. Queria mais, queria sempre mais.
Sabia-o correcto, mas não o queria deixar ir. A sua altivez consumia-a, tornava-a pequena e exígua, frágil e efémera. Debatia-se para lhe dizer adeus, mas sentia já a sua ausência alojada em si, sentia medo da solidão que a ameaçava como um espectro real.
Não fossem as suas frívolas vontades e desejos, as suas futilidades e interesses cobardes, e ele era quase, quase perfeito...